sexta-feira, 17 de junho de 2011

Uma mancha a menos no espelho.

Faz um tempo eu venho tentando escrever algo simples e significativo, no qual eu possa me identificar. Percebi, nesta empreitada, que identificação é um processo longo e constante de auto-descoberta. Eu escrevo. Zilhões de motivos pra isso. Mas rebobinando o VHS da minha caminhada neste planeta, sempre escrevi pra me descobrir. Provas maiores são este blog e minhas agendas, que até no silêncio das não postagens e das páginas em branco querem dizer algo sobre mim.

Ora, porque este blog? Porque Crisálida? Alguns (bons) anos atrás, eu sabia que ser adulto implicava ser muitos. Imaginava que haveria um longo caminho pra desenvolver esses muitos eus. É. Aquele caminho que imaginei estava mais pra tempo. E o tempo é hoje. Todo dia. Mas escrevendo, percebo que o caminho ainda está sendo caminhado. Todo dia. Por mais que hoje eu seja filha, irmã, sobrinha e prima (meio de longe), amiga (meio capenga), afilhada (meio saudosa), tia de reforço do João Pedro, tuiteira, louca por filmes e Supernatural, amante de música que se conecte ao meu espírito, bacharela, sujeito político, cidadã da América-Latina-do Sul, do Brasil, do nordeste, do Piauí, de Teresina e do mundo (ufa!), Yes, baby, I’m on a highway! E essa estrada está ai, em cada eu que faz parte de mim. Tudo o que tenho dito/escrito é parte dessa dinâmica. Então, finalmente, descobri que ser é uma seqüência de vários estar’s. Daí porque a minha tentativa descrita na primeira frase destes escritos restou frustrada: venho estando mais que sendo. Estou para, quem sabe um dia, ser.

Meu grito de Eureka! que ora descrevo veio da leitura de um post do blog de uma querida amiga que hoje completa 41 anos de uma vida bem vivida. Ela é, embora ainda possa estar. Tendo a gostar de pessoas que sabem quem são a partir do que acreditam e do que fazem pelo que acreditam e não a partir do que não gostam. Eu costumo enumerar desejos, lacunas e perspectivas quando se trata de auto-definição. Se parar pra pensar (como hoje faço), me desenho pelo vazio, não-palpável, pelo que pode estar por vir. É aí, estrategicamente, que reside a função primordial deste blog: espaço onde ocupo esses vazios, onde estou, da forma que não sei estar em outros espaços. Eu acho que somos mais nós quando nos libertamos, quando não há restrições ou intimidações. Aqui estou, construindo ser. A propósito, o nome do blog nunca fora tão verossimilhante como o é agora, com toda esta epifania: crisálida, fase de transição da lagarta para a borboleta, ainda envolta numa casca na eminência do rompimento.

Touché! Não posso, mediante o exposto, sentir-me egocêntrica por gritar, neste espaço, palavras que só convergem a mim. Trata-se de um pressuposto de auto-descoberta, sem a qual qualquer manifestação no que tange o outro perde o sentido. É preciso se implicar pra criticar, se expressar e se posicionar. É preciso se conhecer, portanto, minimamente ser (estar), para se implicar. O resto é mais um tanto de vazio no olho do nada. Alcanço aqui dois pontos superados: expiar o fantasma do umbiguismo, que sempre me atormentou pela necessidade deste blog e dar um (pequeno) passo à frente na busca pela minha identidade, perdida, camuflada ou sufocada em algum momento das minhas 24 voltas completas ao Sol.

Entretanto, é preciso que se tome nota de que o estar tem suas variantes e também suas constantes. As variantes são elementos que explicam a própria razão de ser do estar. As constantes são mais uma prova de que ser (estar) humano é estar em contradição. E a verdade é que não encontro grandes dificuldades em enumerar os valores de x da minha reta: tristeza, a dor do mundo, medo e as palavras.

Esses sempre foram os grandes determinantes de meus passos, recuos e inércias. Sempre se completaram ou de alguma forma se relacionaram. Para ilustrar um exemplo disso, quando eu era criança, diante da reiterada tristeza que me arrebatava, seja pela solidão, seja pela não identificação com as coisas e pessoas ao meu redor (eu sempre soube do que eu não gostava), costumava repetir a mim mesma em pensamento, como se um disco ralado fosse, que tudo ia melhorar e que eu só precisava me concentrar em pensamentos positivos e imagens bonitas, como o céu azul, as crianças brincando no parque e os passarinhos cantando. Na verdade, era uma imagem só, muito fixa e tão clara que quase podia tocar, chegando mesmo a sentir. Mas quando abria os olhos encharcados de lágrimas, sabia que se tratava de uma fantasia e me revoltava: eu nunca vi um parque verde, cheio de crianças brincando e com passarinhos cantando na minha infância, a não ser nos livros e nos filmes. Era onde a dor do mundo me consumia e o medo da solidão redobrava. Era onde as palavras dos livros e as rabiscadas pelas minhas canetas ou mesmo as que não ultrapassavam a linha da imaginação me salvavam heroicamente. Escrever era não sofrer, não morrer, não estar só. Era me libertar de mim.

E, num desses estados, registro: como parte do meu ser, escrever (com as mãos ou com a mente) é meu lugar, estando eu, ou sendo. Na tristeza, na dor do mundo e pra vencer o medo, palavras sempre serão minha maior arma para que estando, eu seja e para que sendo, esteja. O meu rompimento com a casca que caracteriza a crisálida é contínuo estar que, por meio de palavras, almeja ser. E viva a auto-descoberta!